sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Anaïs Nin

Entre todas as leituras da minha vida, nunca havia me sentido tão perturbada. A escrita de Anaïs Nin foge das páginas e me deixa ofegante, coisa estranha mesmo. É como algo que eu mesma escreveria, se tivesse tal talento.

Engraçado, jamais senti inveja de escritor algum mas se eu pudesse escolher: escreveria como Anaïs Nin. Mas, não consigo terminar a leitura de nenhum livro dela. Tenho dois: Uma espiã na casa do amor,“um romance sobre os limites das descobertas sexuais”, e Henry & June, “diários não-expurgados de Anaïs Nin (1931-1932)”. Contradições a parte, ela, como eu, era pisciana. haha

Abaixo alguns trechos das duas obras. Começo pelas primeiras linhas que li da francesa Anaïs Nin.



“O detector de mentiras estava dormindo quando ouviu o telefone tocar.

A princípio, acreditou que era o relógio ordenando que ele se levantasse, mas então despertou por completo e se recordou de sua profissão.

A voz que ele ouviu era roufenha, como que disfarçada. Não pôde distinguir o que a alterava: álcool, drogas, ansiedade ou medo.

Era uma voz de mulher; mas podia ter sido de um adolescente imitando uma mulher, ou uma mulher imitando um adolescente.

– O que é? – ele perguntou. – Alô. Alô. Alô.

– Eu tinha que falar com alguém; não consigo dormir. Tinha de telefonar para alguém.

– Você tem algo a confessar…

– A confessar? – ecoou a voz incrédula: dessa vez com os tons ascendentes inequivocamente femininos.

– Você não sabe quem sou?

– Não, apenas disquei cegamente. Já fiz isso antes. É bom ouvir uma voz no meio da noite, isso é tudo.

– Por que um estranho? Você podia telefonar para um amigo.

– Um estranho não faz perguntas.

– Mas minha profissão é fazer perguntas.

– Quem é você?

– Um detector de mentiras.”


“Um caos interior, semelhante àqueles vulcões secretos que, de repente, erguem os sulcos nítidos de um campo pacificamente arado, aguardava, por trás de todas as desordens do rosto, cabelo e roupa, uma fissura por onde explodir.”


“Os pinotes provocadores do toureiro, o ondulante estandarte de ataque dos cavaleiros medievais, uma vela desfraldada em plena colisão com o vento, o escudo do guerreiro diante de seu rosto de batalha, tudo isso ela experimentou quando colocava a capa em volta dos ombros.

Uma capa estendida era a cama dos nômades; uma capa desfraldada, o estandarte da aventura.”


“Ele apareceu como um ponto fixo no espaço. Um rosto calmo. Uma conduta calma. Um tamanho que o tornava visível nas multidões e que se harmonizava com o conceito que Sabina tinha da singularidade dele. A imagem de Alan apareceu na visão dela como um instantâneo.”

Anaïs Nin em Uma espiã na casa do amor




“Conheci Henry Miller.

Ele veio almoçar com Richard Osborn, um advogado que eu tinha que consultar sobre o contrato para meu livro de D.H. Lawrence.

Quando ele saltou do carro e se dirigiu para a porta onde eu estava esperando, vi um homem de que gostei. Em seus escritos ele é extravagante, viril, animal, opulento. E um homem a quem a vida embriaga, pensei. É como eu.”


“Um rosto surpreendentemente branco, olhos ardentes. June Mansfield, a esposa de Henry. Quando ela veio em minha direção da escuridão do meu jardim até a luz da entrada, vi pela primeira vez a mulher mais linda da Terra.”


“O mundo nunca foi tão vazio para mim desde que a conheci. June fornece a carne bela, incandescente, a voz fulgurante, os olhos inescrutáveis, os gestos intoxicados, a presença, o corpo, a imagem encarnada de nossas imaginações. O que somos nós? Apenas os criadores. Ela é.”


“Henry é vida. June é morte.”

Anaïs Nin em Henry & June.

2 comentários:

Unknown disse...

eu curto paks fazer leituras densas, que me colocam sério diante de alguma temática, na maioria das vezes algum fascínio!

foi assim quando li a biografia de Kerouac!

Ter inveja de escritor é algo corriqueiro na minha vida... tenho inveja deles, de cantores, de compositores, de jornalistas... hehe

basta fazer o trabalho que eu admiro, e eu invejo (no bom sentido, é claro).

fiquei curioso em "henry and june".

bjo! xD

Marcos Vinícius Almeida disse...

OI, vi seu texto sobre Ian curtis na Bula..