segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Ian Curtis e "Control"


Não há sol em Manchester
*texto publicado originalmente na Revista Bula.
A minha opinião sobre essa cidade inglesa formou-se marjoritariamente pelas letras dos principais expoentes musicais vindos de lá: The Smiths e Joy Division. Ambos tristes, mas a diferença entre eles é a esperança. Ao ouvir Joy Division encontramos tudo, menos saídas para a confusão. Isso já nota-se mesmo antes de qualquer conhecimento sobre a vida do letrista e vocalista, Ian Curtis.

Um instinto qualquer mostrou-me isso na primeira vez que ouvi a banda. Havia acabado de acordar, liguei a MTV e uma música de cortar o coração me atingiu. Era o clipe de “Love Will Tear Us Apart”. Eu não entendia o que Ian cantava, só a tristeza pungente na voz e na postura do rapaz. A poesia ali ultrapassava a barreira da língua, era palpável. De onde vem isso?, foi o que veio à minha cabeça.

Ian Curtis cresceu num lugar triste e sombrio. Fato. Além das canções, o restante do processo veio à luz com o filme “Control”. Um encanto construído nas bases da “melancolia fria, romantismo negro e desesperança pós-industrial”, ou seja, uma biografia de Ian e em preto e branco. Lá, as fases do jovem foram explicitadas: de garoto problema à estrela do rock, em questão de poucos tempo. E com 23 anos ele já estava enforcado na área de serviço.

Mas como, já diria Cazuza, gravar discos é uma forma de permanecer na Terra, Ian começou a direcionar seus instintos musicais ao som de David Bowie. Para isso, o diretor Anton Corbijn coloca no ator Sam Riley calças bocas de sino e lápis no olho. Eis a imagem do adolescente Ian Curtis. Além da excepcional semelhança física entre ator e cantor, a atuação de Sam é incrível. Da linda cena de amor juvenil com a esposa Deborah Curtis, à confusão diária em que o Ian vivia naufragado, o ator foi perfeito. Tanto que facilmente transporta o espectador e faz acreditar que realmente é Ian e os garotos do Joy Division que vemos ali.

A história do grupo começou em1976, num show dos Sex Pistols. Ian, Bernard, Peter e Stephen eram os caras. E Joy Division foi o fato. Em “Control” ouvimos Ian explicar a ideia. O nome da banda significa “Divisão da Alegria” mas como nada é só o que aparenta, esta divisão era o local onde as mulheres judias eram presas e abusadas sexualmente pelos nazistas, durante a Segunda Guerra.

O nome da banda seria apenas uma forma de chocar as pessoas? Sim e não. A realidade já era chocante o suficiente. Imaginem vocês num show, no final da década de 70, e o vocalista começa a ter crises epilépticas no palco. O que parecia ser apenas um jeito louco de se dançar, era imitação das crises verdadeiras que Ian sofria. Às vezes no próprio palco. Toda essa mistura só era a ilustração corporal da melancolia única presente nas músicas de Ian Curtis.

Por falar em músicas, como elas estão inseridas no filme? Com a carreira de destaquem em videoclipes e fotografia, o diretor Corbijin soube como ninguém aliar as cenas de “Control” às músicas do Joy Division. “Digital”, “Atmosphere”, “She's Lost Control”, “Transmission” todas de uma forma ou de outra impregnadas na tela.

Mas duas me chamaram atenção em especial. Ian e a esposa caminhando pelas ruas de Macclesfield. Debbie questiona o amor de Ian por ela. Ele responde: “Acho que não te amo mais.” E “Love Will Tear Us Apart” explode. Ainda nessa canção, é feita uma reconstrução do clipe clássico (aquele que me referi no início do texto). Lindo!

A outra cena é quando Debbie encontra o corpo de Ian em sua casa. Gritos em meio à Atmosphere. O epitáfio no túmulo do artista: o amor vai nos destruir, tradução de love will tear us apart. 18 de maio de 1980.

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